Polícia Federal volta à Terra Indígena Marãiwatsédé (MT) para conter invasão de não índios
ISA, com assessorias da Opan, Cimi e Greenpeace
Equipes das polícias Federal e Rodoviária Federal retornaram hoje à Terra Indígena (TI) Marãiwatsédé, no nordeste do Mato Grosso, para impedir uma nova invasão de não índios. Ainda não há informação sobre o tamanho do efetivo deslocado para a região.
A ação atende decisão da Justiça Federal em Cuiabá, por sua vez obtida por um pedido do Ministério Público Federal (veja decisão). A área voltou a ser invadida no último fim de semana de forma organizada, depois que homens da Força Nacional de Segurança (FNS) deixaram-na, na semana passada.
Exatamente há um ano terminava a operação de desintrusão de Marãiwatsédé, decorrente de decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que determinou a retirada de todos os não índios. Não é possível reverter a determinação do STF, tendo em vista que o caso transitou em julgado, ou seja, não cabe mais nenhum recurso judicial. Muito menos há hoje alguma decisão da Justiça que pretenda contrariar tal determinação.
De acordo com os Xavante, um grupo de pelo menos 50 pessoas invadiu a localidade conhecida como Posto da Mata, no interior da TI, expulsando servidores da Fundação Nacional do Índio (Funai). Na manhã de domingo (26/1), o cacique Damião Paridzané foi perseguido quando tentava se aproximar do local.
“Eu fui cedo para Mo onipá [como os indígenas chamam o Posto da Mata]. Havia quatro funcionários da Funai. Não consegui chegar lá porque os posseiros fecharam a estrada. Todo o mundo correu atrás da gente”, relata Paridzané. “É preciso agir logo. Não podemos circular pelo nosso território com os invasores aí. O que nos falta agora é segurança. O carro da saúde não pode sair. Estamos preocupados.”
Apesar da presença da FNS ao longo de 2013, diversos grupos foram flagrados pelos policiais e pelos Xavante durante o ano em rondas pela TI, fragilizada mesmo após a desintrusão pela existência de estradas que cortam a área e facilitam invasões. A tentativa de reinvasão constitui crime e um atentado contra a decisão da última instância do Poder Judiciário brasileiro.
Ontem, a Operação Amazônia Nativa (OPAN), o Instituto Socioambiental (ISA), o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e o Greenpeace circularam uma nota pública em que pedem e apoiam o retorno da força policial à TI Marãiwatsédé. O texto cobra a presença do Estado e tratamento digno aos pequenos posseiros que eventualmente estejam no local (veja a nota).
O desejo de que os pequenos agricultores da região vivam com qualidade é também compartilhado pelos índios. Durante o processo de desintrusão, Paridzané falou diversas vezes sobre o equívoco de se polarizar o embate como sendo de brancos contra índios.
“Os políticos não estão preocupados em melhorar a vida nem dos índios nem dos não índios. Será que o governador se preocupa com a situação do povo hoje? Em todos os municípios daqui, o povo não tem água, não tem esgoto, não tem desenvolvimento. Ele, como autoridade de Mato Grosso, tem a obrigação de atender as dificuldades do povo, mas ele não quer. Mas os políticos preferem jogar o branco contra o índio, como se isso fosse resolver alguma coisa”, disse Paridzané em dezembro de 2011.
Entenda o caso
Em 1992, em meio aos trabalhos de identificação, um grupo formado por políticos e fazendeiros organizou uma invasão ao território tradicional dos Xavante, iniciando uma longa batalha judicial pela desintrusão, somente finalizada ano passado com apoio policial. Homologada em 1998, a TI Marãiwatsédé tem 165 mil hectares e, por causa da ação dos invasores, tornou-se um dos territórios indígenas mais desmatados do país (saiba mais).
Em outubro de 2013, o STF confirmou decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) no sentido de considerar que a posse de todos os réus sobre a área em litígio era ilícita, de má-fé, porque eles sabiam que se tratava de terra indígena quando de sua entrada.
A tentativa de invadir novamente Marãiwatsédé ocorre em meio a uma série de ataques à legislação indigenista por meio de projetos inconstitucionais defendidos pela bancada ruralista no Congresso. Entre esses projetos, estão a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215, que tira do Executivo e transfere ao Congresso a prerrogativa de aprovar as demarcações de TIs e o Projeto de Lei Complementar (PLP) 227, que abre as terras indígenas à exploração econômica do agronegócio, empresas de energia e mineração.